Ao amanhecer senti a luz do sol entrando pela fresta da casa de madeira. Na verdade ainda não estava o sol a vista, mas sua luz já estava a iluminar o amanhecer! Amo o amanhecer, mais que o entardecer. Amanhecer é sempre uma nova possibilidade – foi num amanhecer trágico que pude experimentar, junto com a fragilidade a força da vida. E aprendi que não existe força separada da fragilidade, ambas coexistem. Aprendi que não existe um dia em que nascemos, que é preciso nascer todos os dias com o amanhecer. E que, nem sempre o amanhecer é como hoje, céu limpo, de um azul estonteante, de uma luminosidade inquestionável, de sinfonia de passarinhos, de flores vibrante, de filhos arteiros com plena saúde, lindos e alegres, de companheiro parceiro, de mãe que te abraça, de irmã que chega bem cedo para partilhar alguns aspecto da vida, em fim, dia cheio de fertilidade, de possibilidade!!!
Tem amanhecer, cinzento, com vento forte e até agressivo, de chuva torrencial, de lama, em vez de passarinho cantando: trovões, raios ameaçadores, filhos chorosos, companheiro ausente mesmo presente... Aprendi, que nestes dias é fundamental nascer, porque na fragilidade a vida clama... perceber a possibilidade de vida nos momentos mais duros é reconhecer o sentido de fazer parte da “Pacha-Mama”, da Pátria Grande, da Mãe Terra. Para ser sincera, mesmo com esse lindo amanhecer, tive a capacidade de dizer que o dia parecia xoxo, em seguida me dei conta do quanto mesquinha foi minha afirmação, senti o quando ainda mora em mim armadilhas de não-viver, o quanto preciso estar atenta para poder renascer todos os dias. “educar minha Esperança”, foi o que o grande Educador Paulo Freire viveu e por isso ensinou: a esperança precisa ser educada. Reafirmo a necessidade de ser consciente, pois “ser consciente é a forma radical de ser dos seres humanos”. Consciente da necessidade de manter a paixão pela vida, estar apaixonado por alguém, com certeza é muito importante, no entanto não é e nem pode ser tudo. Esse alguém é apenas parte da Vida que clama. Eu não tenho o que reclamar da vida. Estou tendo todas as possibilidades de manter a minha paixão, que é tão ampla e cada vez mais se amplia. Cada vez mais me sinto incapaz de acomodar-me no que já aprendi, no que já fui capaz de ensinar, no que já conheci... cada vez mais sinto o apelo da profundidade, da radicalidade do “ser consciente”, de continuar educando minha esperança para não desacreditar nas pessoas que me cercam, que de mim algo esperam, que não é migalha, compaixão, mas o melhor que posso dar. Minha Mãe conta 42 anos do nascimento de sua 6ª filha e 8º filho dos 11 que teve. Eu, com 42 do primeiro nascimento, conto 3, sim, conto 3 porque é assim que sinto após perder 16 companheiros e ter eu com mais alguns sobrevivido ao trágico acidente de 11 de julho de 2008, nas terras de Rondônia. Sinto-me impelida a acreditar que não estou de passagem, tenho uma missão, faço parte de um plano bem arquitetado de construção do “Bem-Viver”. Ao chegar na sala de trabalho, uma linda planta: Lírio da Paz sobre minha mesa, redonda, onda tantas reuniões de trabalho acontecem, com um cartão personaliza, com uma foto de nossa última mobilização, quase me tiraram o fôlego... muitos abraços, carinho, parabéns. Como não ser uma amante incondicional da vida? Como relaxar no processo de educação de minha esperança? Como não me dispor a partilhar todo o que pude aprender na caminhada, com tantas pessoas? Como me negar a namorar a vida? “Ir vivendo” não faz parte de mim, não pode fazer parte... De mim faz parte a intensidade, a paixão, o desejo do “Ser mais”, da busca inevitável de viver todos os risco para ser e fazer outros felizes, da incansável e necessária busca do “inédito viável”, do desvelar a realidade para conhecê-la e conhecendo transformá-la. Concordo plenamente com Jorge Bucay que diz: “Para se estar satisfeito, ativo, e sentir-se jovens e felizes, é preciso namorar a vida”.
Gratidão pela Vida!
Lurdes Marta Santin
Educadora Popular/Pedagoga
Canoas, 27 de setembro de 2011.
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