Paulo Freire em Pedagogia da Esperança relata um momento onde Educação e Saber Popular se encontram.
No Chile, numa tardinha de vários “círculos de cultura”, sentiu 'um forte desejo de dialogar com o grupo de camponeses'.
Depois da aceitação e de um silêncio desconcertante... relata uma fala que surge...
- “Desculpe, senhor”, disse um deles,.. “O senhor é que podia falar porque o senhor é o que sabe. Nós, não”.
- “Muito bem”, respondeu. “Aceito que eu sei e vocês não sabem.”
E então propôs um jogo:
- "Vou dividir o quadro-negro em dois pedaços, em que irei registrando, do meu lado e do lado de vocês, os gols que faremos eu, em vocês; vocês, em mim. O jogo consiste em cada um perguntar algo ao outro. Se o perguntado não sabe responder, é gol do perguntador. Começarei o jogo fazendo uma primeira pergunta a vocês.”
— Que significa a maiêutica socrática?
Gargalhada geral e eu registrei o meu primeiro gol.
— Agora cabe a vocês fazer a pergunta a mim — disse.
Houve uns cochichos e um deles lançou a questão:
— Que é curva de nível?
Não soube responder. Registrei um a um.
— Qual a importância de Hegel no pensamento de Marx?
Dois a um.
— Para que serve a calagem do solo?
Dois a dois.
— Que é um verbo intransitivo?
Três a dois.
— Que relação há entre curva de nível e erosão?
Três a três.
— Que significa epistemologia?
Quatro a três.
— O que é adubação verde?
Quatro a quatro.
Assim, sucessivamente, até chegarmos a dez a dez. Ao me despedir deles lhes fiz uma sugestão:
“Pensem no que houve esta tarde aqui. Vocês começaram discutindo muito bem comigo. Em certo momento ficaram silenciosos e disseram que só eu poderia falar porque só eu sabia e vocês não. Fizemos um jogo sobre saberes e empatamos dez a dez. Eu sabia dez coisas que vocês não sabiam e vocês sabiam dez coisas que eu não sabia. Pensem sobre isto”.